sábado, 9 de fevereiro de 2013

Niede Guidon faz desabafo: 'Perdi foi o meu tempo vindo ao Brasil'

 
Niede Guidon
 A nova edição da revista Revestrés, referente aos meses de janeiro / fevereiro, traz uma polêmica entrevista com a arqueóloga Niede Guidon. A entrevista é baseada na persistência da francesa que adotou o Piauí, ou para ser mais específico a cidade de São Raimundo Nonato, sul do estado, como moradia.

Trecho do início da entrevista: "Centralizadora e mandona. Corajosa e persistente. As opiniões se dividem quando a tentativa é descrever a mulher que considera a Serra da Capivara “um pedaço do paraíso”. Ela conserva, além do sotaque arrastado em algumas palavras, um certo humor francês, seco e sutil. Racional, como se convencionou pensar que cabe a uma cientista. Emocional, como não poderia deixar de ser, ou não encontraria razão para brigar há tanto tempo contra situações crônicas: dificuldades financeiras, burocracia estatal, falta de vontade política, invasões de caçadores e conflitos com aqueles que já viviam nas terras da Serra da Capivara muito antes da cientista chegar, cheia de novidades. Por alguns desses motivos já teve a vida ameaçada. Mas resiste. Embora desabafe: “Eu perdi o meu tempo vindo ao Brasil”. As posturas de confronto ajudam a manter a fama de durona".

Na entrevista, Niede desabafa a respeito de certos aspectos sobre São Raimundo Nonato e a Serra da Capivara: "Quando assumimos cuidar do Parque da Serra da Capivara, fizemos um estudo completo. O então presidente do Banco Interamericano, Enrique Iglesias, considerou o modelo que estávamos implantando como ideal por unir proteção à natureza e à cultura com benefício para a população e desenvolvimento econômico e social para a região. Porque realmente era uma região muito pobre. Iglesias botou o banco à disposição, mandou técnicos para cá. Eles pesquisaram e concluíram que a agricultura não seria uma solução. O solo é salgado, raso, cheio de pedras. Mas apontaram o potencial turístico. Nós contratamos uma firma suíça que fez o projeto para implantação do turismo. Naquela ocasião, em 1995, eles estimaram que teríamos cinco milhões de turistas/ano. Hoje os sítios patrimoniais da humanidade, no mundo todo, recebem essa média de turistas. O único que não recebe é a Serra da Capivara, que tem apenas 20 mil turistas por ano. (Isso acontece) porque aqui (em São Raimundo) não tem acesso, não tem aeroporto, não tem hotel. Tem um parque patrimônio da humanidade na África do Sul, você vai lá e visita quatro sítios, mas tem toda a estrutura. Na Austrália há um parque que não chega a 10 sítios e tem um lucro líquido anual de 10 milhões de dólares. Aqui nós temos 162 sítios preparados para visitação. Depois de insistirmos com o Governo Federal, finalmente, em 1996, foi criado o Aeroporto Internacional Serra da Capivara. Em 97 foi liberada verba de 15 milhões, só que não chegou nada aqui. Acho que derreteu em Teresina. O Governador era Mão Santa, e ele declarou que aeroporto é coisa para rico, que pobre precisa é de estrada. Botou umas máquinas na estrada, ganhou as eleições e acabou. Nem aeroporto, nem estrada. Aqui toda a infra-estrutura do Parque foi feita com dinheiro do Banco Interamericano. A França até hoje é parte fundamental nas pesquisas".

Ao falar de políticos, sobre sua, digamos, conturbada relação, já que ora ou outra aparece cobrando recursos que seriam destinados ao turismo na Sera da Capivara, ela é enfática: "E não é isso que eles (políticos) fazem sempre? Confusão, tornar a situação pior? Eu dou um exemplo: a educação. Eu fiz escola pública no Brasil, em grupo escolar. Quando eu fui para a França e fiz o concurso, escrito em francês, eu passei em primeiro lugar, com a minha formação brasileira, com o francês que eu aprendi aqui, na escola pública. No meu tempo você estudava francês, espanhol, inglês, tudo em escola pública". Ao falar sobre atuar como uma postura mais dura, ela até brinca: "Acho que sou até boazinha demais. Eu quero ficar é cada vez mais malvada (risos)! Acho que não pode ter medo. Quando uma pessoa faz algo errado, você tem que dizer para ela. Se ela continua no erro, aí tem que ir para cima mesmo. Por exemplo: esses guias. Há anos que trabalhamos com guias. Agora eles têm três associações, me chamam de mandona e cada uma das associações quer mandar. Então nós vamos transformar esse parque na bagunça que é o Brasil? Nós fizemos esse parque em nível internacional! Eu não trabalhei do jeito que trabalhei para entregar o parque na mão de alguns. Então eu vou para cima mesmo. Se é para brigar, eu brigo mesmo. Por fim ela fala sobre uma pesquisadora do Instituto Butantã que trabalha na Serra da Capivara e que descobriu um novo tipo de aranha e batizou a espécie com o seu nome: "Sim, é uma aranha cuja picada é mortal. Aí ela (a pesquisadora) disse: “escolhi o teu nome de propósito” (risos). Ela botou meu nome na aranha que é do tipo “picou, morreu”".


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